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© Fernando José Pereira

“tempos sem tempo para ter tempo” – Notas sobre a relação contemporânea das artes com o Tempo.

Fernando José Pereira

16h00
AULA ABERTA
Auditório ep1

Desde há alguns anos que desenvolvo o trabalho baseado numa noção que me tem acompanhado. A essa noção designei-a como par(a)gem. Antes de mais, porque dentro da palavra existem dois verbos paradoxalmente antagónicos: parar e agir. E este parar e agir é, nada menos, nada mais, que uma afirmação da possibilidade contemplativa, despojada do seu carácter pejorativo de conexão com a passividade. Aqui trata-se de repor uma verdade: a contemplação nunca foi passiva, bem pelo contrário. Trata-se, portanto, de uma contemplação activa que se opõe, isso sim, declaradamente a uma passividade contemporânea baseada na instantaneidade que é imposta no quotidiano.
Uma atenção necessária ao tempo e à duração, chamemos-lhes, necessários. Um tempo que é imprescindível para se poder julgar, para se poder apreciar, para se poder fruir. Um tempo que escapa à ditadura do maquínico, do híper-rápido, do techno sublime, diria Jameson. E este é o tempo que a arte (pelo menos alguma) reivindica e que, ao fazê-lo, a coloca na posição que sempre quis ter. Aquela que a potencia enquanto possibilidade alternativa à comunicação, que a coloca nessa posição invejável de “gasto inútil” como afirmava Battaile. Um gasto inútil mas verdadeiramente humano, longe das temporalidades impostas pela ideia de crescimento contínuo, pela presença da catástrofe.
Se são temporalidades incómodas, se provocam uma espécie de exterioridade no frenesim do quotidiano, ainda bem.
São essas características verdadeiramente importantes para as práticas artísticas, em particular as chamadas time based art que lhes dão a capacidade de poderem continuar. Que as colocam, já não numa redoma fechada, mas numa situação de intrusão na realidade.
Que possuem a capacidade de provocar um sobressalto, mais não seja, pela estranheza, mesmo que familiar, que exalam ao afirmarem-se de forma tão estranhamente diferenciada da produção pandémica da imagética do nosso tempo sem tempo. Estas últimas são apenas restos e rastos. A par(a)gem é tempo e, em particular, duração, em todo o seu esplendor.

Fernando José Pereira

Fernando José Pereira(1961, Porto). Desenvolve uma prática artística na qual a utilização do vídeo se destaca desde os anos noventa. Enquanto membro do coletivo de música electrónica experimental Haarvöl, tem vindo, mais recentemente, a explorar a relação entre o vídeo e a música. Professor associado na Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto, director do Curso de Doutoramento em Artes Plásticas e investigador integrado no Instituto de Investigação em Arte, Design e Sociedade (I2ADS).
Expôs individualmente em Do Tempo Exilado ou a Emergência da Utopia (Sismógrafo, Porto, 2017), Suspensão (Zona Noérgica) (Gnration, Braga, 2016), O Artista como Explorador Ártico (C.A.A.A. – Centro para os Assuntos da Arte e da Arquitetura, Guimarães, 2013), Untitled (Speechless) (Skaftfell Center for Visual Art, Seydisfjordur, Islândia, 2012). Entre as mostras coletivas figuram Studiolo XXI – Desenho e afinidades (Fundação Eugénio de Almeida, Évora, 2019), Contrato a Tempo Indeterminado (Museu Internacional de Escultura Contemporânea, Santo Tirso, 2018), Variatons Portugaises (Abbaye Saint André-Centre D’Art Contemporain, Meymac, França, 2018), Them or Us (Galeria Municipal do Porto, Porto, 2017), A Arte Como Experiência do Real – Coleção de Ivo Martins em depósito no Museu de Serralves (CIAJG; Guimarães, 2017). O seu trabalho está representado em coleções privadas e em coleções públicas como: Fundação de Serralves, Centro Galego de Arte Contemporânea (CGAC), Fundação Calouste Gulbenkian, Coleção Fundação PLMJ, Fundação Ilídio Pinho.

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